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Artista Pedro Weingãrtner - Currículo do Artista

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Pedro Weingãrtner

Pedro Weingärtner

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Pedro Weingärtner (Porto Alegre, 26 de

julho de 1853 — Porto Alegre, 26 de dezembro

de 1929) foi um pintor, desenhista e gravurista

teuto-brasileiro.

Filho de imigrantes alemães, provavelmente foi

introduzido na arte por seu pai, que era um

desenhista diletante. Com 24 anos decidiu

dedicar-se à pintura e foi estudar na Europa às

suas próprias custas. Depois de algum tempo

passou a ser financiado pelo imperador Dom

Pedro II. Permaneceu vários anos frequentando

academias famosas e recebendo orientação de

distinguidos professores. Depois de terminada

sua preparação instalou um atelier em Roma,

mas viajava com freqüência para o Brasil, onde

fez muitas exposições e conheceu a fama, sendo

considerado um dos melhores pintores

brasileiros em atividade. Nos seus últimos anos

fixou-se em Porto Alegre, mas passou a

enfrentar a concorrência dos pintores da nova

geração, inclinados para a estética modernista.

Viveu num período de profundas

transformações na sociedade e na cultura do

ocidente, em que se chocaram dois modelos

radicalmente diversos de civilização. Foi um fiel

e disciplinado seguidor dos princípios

acadêmicos mais conservadores, mas não

permaneceu alheio ao mundo em mutação ao seu redor, e sua obra vasta e polimorfa é um sensível

reflexo das contradições de seu tempo. Seu estilo funde elementos neoclássicos, românticos,

naturalistas e realistas, expresso em paisagens, cenas de gênero e retratos, dedicando-se também

aos temas clássicos e mitológicos. Sua contribuição mais notável à arte brasileira talvez sejam suas

pinturas de inspiração regionalista, retratando imigrantes e gaúchos em suas atividades típicas,

que têm grande valor estético e documental, sendo um pioneiro neste campo temático. Era dono de

uma técnica refinada que dava grande atenção ao detalhe, e que em certos momentos se

aproximou da fidelidade fotográfica. Deixou também vários trabalhos em gravura em metal, outro

campo em que foi um precursor no Brasil.

Quando faleceu, as vanguardas modernistas já o consideravam um artista ultrapassado, e com a

hegemonia que rapidamente conquistaram sua produção foi esquecida com a mesma celeridade.

Somente nas últimas décadas vem recuperando prestígio. No Rio Grande do Sul sua posição já está

assegurada como o mais notável dos seus pintores acadêmicos e como uma figura fundamental

para o entendimento da evolução das artes no estado na virada do século XIX para o século XX, e

embora tenha trabalhos em inúmeras coleções privadas e em grandes museus do Brasil, o que se

conhece de sua vida e obra ainda é em muito fragmentário e desconexo. Vários pesquisadores,

 

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Estudos anatômicos, sem

data. Pinacoteca Barão de

Santo Ângelo

especialmente gaúchos, atualmente estão se dedicando a remediar esta situação, e sua reputação

começa a se restabelecer no resto do país, mas muito ainda está por fazer para que sua

contribuição seja corretamente entendida e apreciada.

 

Era filho dos imigrantes alemães Inácio Weingärtner e Angélica Schäfer. Seu pai apreciava a arte e

desenhava amadoristicamente, transmitindo seu gosto para seus cinco filhos e duas filhas. Seus

irmãos Inácio Junior, Miguel e Jacob levariam a arte a sério e se dedicariam à litografia, e com

toda probabilidade Pedro foi iniciado nas artes gráficas por Inácio Junior, que era oito anos mais

velho e fora aluno de um respeitado litógrafo alemão domiciliado em Porto Alegre, Augusto Lanzac

von Chanac, mantendo mais tarde uma oficina gráfica própria que ganhou fama na cidade

produzindo todo tipo de ilustração e impresso, incluindo retratos e paisagens urbanas. Walter

Spalding referiu, a partir de informações transmitidas pela viúva do pintor, que ele teria recebido

lições de desenho de Araújo Guerra, hábil caricaturista português, mas isso parece improvável, já

que só constam registros de sua presença na cidade a partir de 1880. Aquiles Porto Alegre disse

que Pedro frequentou o ateliê do pintor Delfim da Câmara, embora não se saiba se era um aprendiz

ou mero visitante.[1][2]

Depois da morte do pai, em 1867, Weingärtner teve que buscar emprego para auxiliar a família

numerosa. Conseguiu uma colocação na Ferragem Rech, e por sua dedicação ganhou a confiança

do patrão e passou a receber um ótimo salário, mas a jornada era longa e não lhe permitia praticar

suas habilidades artísticas senão à noite, em poucas horas que roubava ao sono. Angelo Guido, seu

primeiro e principal biógrafo, afirmou que ele detestava o trabalho e por isso, em 1877, chegou a

adoecer gravemente. Mudando-se para o campo, sob os cuidados da família, alarmada com sua

condição, em poucos meses estava restabelecido, tendo passado todo este tempo entregue a

desenhar e a pintar. Mais tarde ele reconheceria que a doença fora providencial, permitindo-lhe

reconhecer inequivocamente sua verdadeira vocação.[3]

 

Assim, em 12 de fevereiro de 1878, reunindo suas economias e

enfrentando forte resistência familiar, Weingärtner partiu para a

Europa, a fim de obter formação acadêmica no Liceu de Artes e Ofícios

de Hamburgo. Mas não permaneceu ali, dirigindo-se em outubro do

 

mesmo ano para Karlsruhe, a fim de ingressar na Academia Grão-

ducal de Arte de Baden, na época dirigida por Ferdinand Keller. Nesta

 

conceituada escola estudou com Theodor Poeckh e também

possivelmente com Ernst Hildebrand, e deve ter recebido influência

do próprio Keller. Segundo um atestado de frequência emitido pela

escola, ele fez "muitos progressos".[4]

 

Com a transferência de Hildebrand para Berlim em 1880, Weingärtner abandonou a escola e o

seguiu, matriculando-se em 12 de outubro na Real Academia de Artes da Prússia, onde iniciou seu

treinamento na pintura a óleo. Datam desta época suas primeiras paisagens, e seus avanços já

 

eram significativos o bastante para poder enviar alguns trabalhos para a Exposição Brasileira-

Alemã de Porto Alegre. A influência de seus mestres alemães se revela no seu amor pelo detalhe,

 

pela obra diminuta e pela dedicação à pintura de gênero então em voga, com um estilo realista e

suas temáticas poéticas e sentimentais do cotidiano popular. Outros pintores que podem ter

deixado uma marca em sua produção foram os românticos alemães do início do século, como

Vida

 

Primeiros anos

 

Estudos na Europa

 

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Atelier na Academia Julian,

c. 1882. Museu de Arte do

Rio Grande do Sul

 

Má colheita, 1889. Coleção particular

 

Ludwig Richter e Ferdinand Waldmüller, e contemporâneos seus

como Hans Thoma, Karl von Piloty, Franz von Defregger, Max

Liebermann e Emil Schindler.

[2][5]

 

Nesta altura sua situação financeira começou a se tornar difícil, suas

economias se esgotavam, e aparentemente a família não tinha

condições de ampará-lo. Sem poder sustentar-se, decidira arranjar

emprego como fotógrafo e abandonar a pintura. A situação foi

revertida temporariamente através de uma pequena pensão oferecida

por seus amigos brasileiros Martin Bromberg, Jacob Koch e

Bartolomeu Sesiani, ricos comerciantes em viagem turística que ele

encontrou por acaso, podendo com este auxílio continuar seus

 

estudos.[6]

Em 1882 se dirigiu a Paris, na França, onde estudou na Academia Julian com Tony Robert-Fleury e

William Adolphe Bouguereau, artistas de enorme fama que permaneciam fiéis à tradição

acadêmica em plena efervescência do surgimento das vanguardas pré-modernistas, como o

impressionismo. Em Paris disciplinou-se no estudo do nu, um motivo muito prezado pelo público

francês e considerado obrigatório para que um artista demonstrasse sua competência, e entrou em

contato mais profundo com a tradição clássica, o que se refletiu em obras de caráter historicista

inspiradas em temas da Antiguidade.

 

[2][7] Também ali deve ter sido introduzido na técnica da

 

gravura em metal.

[8]

 

Em 1883, novamente na penúria, foi obrigado a abandonar a Academia Julian. Para poder

completar sua formação, em 13 de abril solicitou uma pensão ao imperador Dom Pedro II, a qual,

por intervenção do Barão de Itajubá, embaixador brasileiro em Paris, reforçada com um atestado

de proficiência que Bouguereau forneceu, lhe foi concedida em janeiro do ano seguinte, ao valor de

trezentos francos.

[2][9]

 

Em 1884 participou de seu primeiro salão da

Academia Imperial de Belas Artes, na cidade do Rio

de Janeiro, para onde enviou dois retratos, um do

frei Caetano de Troyana e outro do kaiser

Guilherme I, bem como cinco estudos de cabeças

realizados ainda em Berlim, os quais, se não lhe

granjearam muita notoriedade, pelo menos

justificaram sua pensão aos olhos do governo

brasileiro.[2]

No ano seguinte excursionou pelo Tirol, fixando-se

em Mayrhofen, onde a título de experiência executou obras inspiradas no impressionismo com

tipos e paisagens locais, mas por fim optou deliberadamente por seguir sua índole acadêmica,

acentuando-se o caráter realista de suas composições. Depois visitou Munique, na época o mais

dinâmico centro da cultura alemã, onde teve aulas com Karl von Piloty. A viagem não foi longa,

devido a exigências nos termos de seu contrato de pensão, e em 1886 seguiu para Roma, onde

abriu em 1887 um ateliê na Villa Strohl-fern, um palacete com cem ateliês de aluguel que foram

frequentados por muitos artistas que se tornariam famosos, como Ilya Repin, Emil Fuchs e Mikhail

Vrubel.

[2][10]

Após sua instalação, já ausente do Brasil há muitos anos, pediu autorização do imperador para

uma visita de seis meses à pátria, chegando em Porto Alegre em agosto de 1887 e sendo recebido

com festa em um navio embandeirado lotado de amigos e admiradores. Embora em férias, pintou

Maturidade e fama

 

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Bailarinas, 1896. Pinacoteca Barão de Santo

Ângelo

 

Pompeianas no caldário, 1900. Pinacoteca

APLUB

 

Ceifa em Anticoli, 1903. Pinacoteca do Estado de

São Paulo.

 

vários retratos que causaram impressão muito

positiva e mostrou obras trazidas da Europa,

tornando-se logo uma unanimidade de crítica e de

público, objeto de várias notas e artigos na

imprensa. Por força dos compromissos assumidos,

deixou Porto Alegre em novembro, seguindo para o

Rio de Janeiro, onde realizou sua primeira

exposição individual, em fevereiro de 1888.

Apresentando dez trabalhos, o evento foi um êxito.

Oscar Guanabarino, arrebatado, o considerou o

mais destacado pintor do Brasil.[2][8] Aproveitou a

estadia na cidade para visitar o imperador, a fim de

expressar sua gratidão pelo auxílio recebido.

Durante o encontro o monarca admirou-se com a

tela Direitos documentados, que viu em uma

fotografia trazida pelo artista. Informado de que a

obra lhe fora enviada da Europa como presente,

disse que ela jamais havia chegado às suas mãos.

Weingärtner acabou descobrindo que ela havia

ficado retida na alfândega e, não sendo reclamada,

fora posta em leilão, e teve grandes trabalhos para

localizá-la e recuperá-la do adquirente. O caso foi

muito comentado na imprensa e atraiu grande

público adicional para a exposição que estava em

andamento.[11]

Terminadas suas férias, voltou a Roma, onde

iniciou um período especialmente fértil de sua

carreira, trabalhando incansavelmente e visitando

locais de interesse histórico e artístico, como ruínas,

museus e monumentos, sendo especialmente

atraído pela aura fascinante de Pompeia e

Herculano, que alimentaram seu amor pela

Antiguidade e lhe abriram um novo repertório de

motivos e modelos formais.[12][13] Roma, embora já

não sendo mais o foco da vanguarda artística

europeia como fora durante séculos antes, ainda era

um grande polo cultural, escolhida como domicílio

de outros importantes artistas brasileiros em formação, como Zeferino da Costa e Henrique

Bernardelli, com quem manteve contato, e ali pode ter recebido influência dos acadêmicos realistas

Giacomo Favretto, Nino Costa, do grupo In Arte Libertas e sobretudo de Domenico Morelli, na

época o mais destacado representante italiano desta escola.[13][14] Seu atelier, como registrou

Ercole Cremona, "era um verdadeiro repositório de coisas de arte, metodicamente grupadas; peles

raras de animais da terra distante punham no ambiente um quê de saudade... Nesse ambiente vivia

o pintor, trabalhava de sol a sol".[15] Passava os verões no vilarejo de Anticoli Corrado, em

companhia de seu amigo e pintor espanhol Mariano Barbasan, desfrutando da paisagem luminosa

e colorida da região, que surge em vários trabalhos de fatura mais livre e cores mais vibrantes,

onde parece apreciar mais a pura materialidade da pintura.[16]

 

Até 1920 ficaria dividido entre Itália

e Brasil, realizando muitas viagens e diversas exposições individuais e coletivas, em geral vendendo

bem, às vezes os lotes inteiros de suas individuais.[2]

Em 1891, já no Brasil, foi contratado como professor de Desenho Figurado na Escola Nacional de

Belas Artes, no Rio, mas passava suas férias no sul, onde aprofundou seu interesse pelos aspectos

típicos das regiões de colonização alemã e italiana, que já havia começado a abordar ainda na

 

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Chegou tarde!, 1890. Museu Nacional de Belas

Artes

 

Vida nova (Nova Veneza), 1893. Acervo

municipal de Nova Veneza

Europa há alguns anos. Datam deste período obras importantes como Tempora mutantur (1889),

 

Chegou tarde! (1890), Fios emaranhados (1892) e Kerb (1892).[17] Em 1893, ano em que demitiu-

se do cargo na Escola Nacional, foi incluído na representação brasileira para a Exposição Universal

 

de Chicago, suscitando elogios,[18] e fez um giro pelo interior do Rio Grande do Sul e Santa

Catarina, documentando a Revolução Federalista e fazendo apontamentos para uma série de obras

dedicadas a temas gauchescos, que assumiriam um lugar de relevo em sua produção

posterior.[2][8]

 

Em 1896 estava novamente na Itália, mudando seu

atelier para a Associazione Artistica Internazionale,

na Via Margutta, uma academia que concentrou os

brasileiros que estudavam na cidade e que atraiu

muitos estrangeiros notáveis como Fortuny, Böcklin

e Lenbach, e era também uma espécie de clube

social onde se organizavam saraus e festas. O

dinâmico grupo que a frequentava possivelmente

foi uma influência sobre o brasileiro.[19] Lá recebeu

um honroso e especial convite para expor no salão

da Escola Nacional, feito pelo Conselho Superior de

Belas Artes da República do Brasil. Somente outros

três artistas receberam distinção semelhante: o

brasileiro Zeferino da Costa e os franceses Puvis de

Chavannes e Auguste Rodin, o que indica o

prestígio que desfrutava. O mesmo, ao que se sabe,

ocorria na Itália, tendo granjeado a estima da

aristocracia romana e do próprio papa Leão XIII, e

seu atelier se transformara em ponto de encontro de

personalidades. O presidente brasileiro Campos

Sales, quando esteve em visita à capital italiana, foi

uma delas.[20]

O ano de 1897 foi marcado pela notícia da morte de

sua mãe.[8] Entre esta data e 1898 realizou duas de

suas mais aplaudidas exposições em Porto Alegre,

numa delas vendendo o Tempora mutantur para o

governo estadual, que o instalou no salão nobre do

Palácio Piratini, mas aparentemente não estava no

país, enviando as obras de Roma.[2] Participou da

Exposição Universal de Paris em 1900, e no mesmo

ano voltou para o Brasil, pintado retratos em Porto

Alegre e fazendo sua primeira exposição em São Paulo, com excelente receptividade, vendendo

tudo, com três telas adquiridas por Campos Sales para ofertá-las ao presidente argentino Julio

Roca, em visita oficial. O Correio Paulistano qualificou sua imaginação de "poderosa e brilhante",

entre outros elogios, mas também relatou que alguns modernistas já começavam a criticá-lo como

um "convencionalista nebuloso". Em março de 1902 partiu para Roma para mais um período de

trabalho, mas continuou a enviar regularmente telas para o Brasil. Nesta época deve ter iniciado

sua série de gravuras em metal, sendo um dos primeiros brasileiros a se dedicarem a esta

técnica.[8]

Voltou a Porto Alegre em 1905, a fim de recuperar-se de um esgotamento por excesso de

atividades, e retornou à Itália em 1906.[2] Em 1909 enfrentou uma inesperada onda de fortes

críticas ao apresentar sua tela Rodeio, que foi vista pelo público portoalegrense como uma

falsificação das verdadeiras características dos gaúchos, um caso isolado em sua carreira mas que o

deixou bastante abalado. Neste momento, a conselho de Joaquim Nabuco, de quem se tornara

 

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A fazedora de anjos, 1908, Pinacoteca do Estado

de São Paulo

 

Pousada, 1914. Pinacoteca APLUB

 

amigo, viajou para Portugal, onde em meio a cenários e tipos pitorescos esperava esquecer o infeliz

incidente, ao que parece com bom resultado, pois suas obras portuguesas têm cores vibrantes e

uma atmosfera bucólica.[2][21]

Em 1910 já estava novamente a caminho do sul, mas de passagem por São Paulo realizou outra

exposição importante, com cerca de cinquenta telas, muitas com temas portugueses, recebidas

efusivamente pela crítica e pelos colecionadores, que compraram todas. Entre elas estava A

Fazedora de Anjos, que causou sensação e foi adquirida pela Pinacoteca do Estado de São Paulo,

tratando de um tema lúgubre e atípico em sua obra, o infanticídio.

 

[2][22] Chegou em Porto Alegre

no fim do ano e em 1911 casou-se com Elisabeth Schmitt, que conhecera em 1892. Disse o artista

que somente agora, estando em uma situação econômica estável e confortável, sentiu-se seguro

para assumir esta grande responsabilidade.[23] No ano seguinte voltou a São Paulo para expor 46

pinturas.[8] Em 1912 estava outra vez em seu ateliê em Roma, mas ali não se demorou. Disse

Angelo Guido que o pintor estava em crise:

"Chegara a um desses pontos críticos

na vida do artista, o qual, sendo de

plenitude, é ao mesmo tempo aquele

que pode representar a impossibilidade

de ir mais adiante ou de continuar a

ascensão. Efetivamente, ao voltar para

seu atelier em Roma, continua a

trabalhar assiduamente como antes,

mas parece não ter ânimo para

enfrentar algumas daquelas

composições de motivos clássicos ou

de vivo conteúdo humano que lhe

firmaram o renome de artista. Limita-se

a pintar pequenos quadros de gênero,

onde não o espírito criador está

presente, mas a habilidade técnica, que

a tinha aliás, altamente desenvolvida.

Sente que precisa de motivos novos, de

uma nova paisagem natural e humana

que o emocione, como o emocionaram

os assuntos clássicos e os aspectos de

Anticoli.... E seus pensamentos e

anseios de realização voltaram-se para o Rio Grande do Sul. Não que não o tivesse

pintado com suas paisagens e suas gentes, mas talvez se apercebesse que sua terra

tinha aspectos e motivos ainda não estudados com a paixão com que estudara

aqueles de Anticoli, que lhe inspiraram tão notáveis telas.... sentiu que em contato com

a nossa paisagem poderia realizar coisas novas, não pintadas ainda por ninguém,

como efetivamente depois as pintou, associando deste modo, mais vivamente, a sua

arte à terra em que nasceu".[24]

 

De fato, em 1913 voltou ao Brasil. Passando pelo Rio mostrou vários trabalhos, com excelente

repercussão,[8] e em Porto Alegre participou da fundação do Centro Artístico, uma associação que

objetivava desenvolver o gosto pelas artes no estado. Após seis meses de sua chegada apresentou,

numa exposição organizada pelo Centro, 33 novas pinturas que retratavam os hábitos e

personagens típicos do estado, mas já não tanto os imigrantes e os caixeiros-viajantes,

concentrando-se em vez nos gaudérios do pampa, um tema inédito na pintura brasileira, vendendo

quinze telas. Mesmo assim, não abandonaria outros temas que lhe foram caros anteriormente. Em

1920 deixou para sempre a Europa e se fixou definitivamente na capital gaúcha.[2][8][25]

Anos finais

 

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Auto-retrato assinado, 1927

Instalou um atelier em sua casa e a despeito da idade avançar ainda sentia-se vigoroso,

continuando sua produção artística em ritmo intenso. Trabalhou em diversas temáticas, mas deu

especial atenção, nesta fase, às paisagens, retratando os cenários de diversas localidades do estado.

Continuava a expor com regularidade em Porto Alegre e no centro do país, e, como sempre, era

recebido favoravelmente e ainda vendia muito. Mas pouco a pouco o peso dos anos se fazia sentir.

Passou a experimentar algumas dificuldades motoras e a visão enfraquecia, já pouco viajava.[26]

Em 1925, sempre fiel à sua estética acadêmica, fez sua última exposição em Porto Alegre, que teve

fraca receptividade. Os tempos mudavam, fermentava um novo modelo de civilização e de cultura,

e seu estilo já soava como um anacronismo. Depois disso o mestre não foi mais visto em público.

Em 1927 sofreu um derrame que o deixou hemiplégico e prejudicou seriamente sua lucidez e sua

memória. Faleceu um dia após o Natal de 1929. Vários jornais noticiaram seu desaparecimento,

mas notava-se que não falavam dele com o entusiasmo de antes.[2][27]

 

Praticamente só contamos com os registros de Angelo Guido sobre sua

personalidade, mas deve-se notar que o biógrafo muitas vezes tende a

enaltecer seu sujeito. Embora não haja razões para desconfiar da

verdade do que disse, ao descrever suas muitas virtudes parece se

deixar levar pela poesia que nutre um admirador e pela amizade que

com ele entreteve. Um trecho serve como uma impressão sucinta de

sua pessoa e da apreciação que o autor lhe fez:

 

"Certos aspectos da pintura de Pedro Weingärtner só

poderão ser compreendidos em toda a sua significação se

tivermos em conta a própria índole do pintor, calma,

vivamente compreensiva e dotada da profunda

capacidade para se afeiçoar às criaturas, aos lugares e às

coisas. O traço fundamental do seu caráter era

incontestavelmente a bondade. E por ser bom era

igualmente compreensivo e simples, de uma simplicidade

tão natural, tão do seu feitio que chegava, por vezes, a

parecer infantil, na vida como na arte.

"Embora reservado e sonhador, ninguém era mais sem complicações do que ele, mais

acessível e suavemente comunicativo e delicado no trato com as pessoas que sabiam

chegar até sua alma; alma que não se abria facilmente e nunca se manifestava em

efusões estrepitosas. Mas que nem por isso deixava de estar sempre atenta para

receber e amar o que fosse belo e digno, puro e sincero. A impressão que Pedro

Weingärtner nos deixou quando pela primeira vez lhe falamos, numa exposição em

São Paulo, foi de que antes de tudo ele era uma alma. E quando, mais tarde, em Porto

Alegre, também numa exposição, de novo o encontramos e pudemos ter a satisfação

de o conhecer melhor, pareceu-nos que aquela alma devia andar sempre cheia de sol

e que mesmo em momentos de preocupações e tristezas, que não podiam faltar a

quem como ele era tão bom e tão sensível, sempre havia sol a coar entre as sombras,

como através daquelas pérgolas acolhedoras que frequentemente vemos em seus

quadros, onde à vida das criaturas quis associar a beleza da luz e os encantos da

natureza".[28]

O homem

 

Seu contexto

 

O academismo europeu e sua influência no Brasil

 

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Estudo de crânio, sem data.

Pinacoteca Barão de Santo

Ângelo

 

A obra de Pedro Weingärnter se insere perfeitamente no panorama da

pintura brasileira na passagem do século XIX para o século XX. Este

panorama era determinado pelas convenções do academismo, que

neste período se constituía em uma mistura eclética de tendências

neoclássicas, românticas, naturalistas e realistas. O centro dinâmico

da pintura nacional era a Academia Imperial de Belas Artes,

patrocinada pelo próprio imperador como agente importante em seu

programa nacionalista de modernização e unificação do Brasil para

sua inserção digna em uma nova ordem capitalista internacional, e

que na república foi reestruturada, sem mudanças essenciais, como

Escola Nacional de Belas Artes. Ali deram aulas muitos dos pintores

mais notáveis em atividade, irradiando um modelo estético e

pedagógico que influiu em todo o país e inspirou a criação de várias

academias regionais, como o Instituto Livre de Belas Artes de Porto

Alegre. A Academia Imperial, mesmo sempre atravessando crises por

falta de condições para um funcionamento pleno e por muitas

discórdias internas, ditou o padrão de toda a melhor arte produzida no

Brasil até fins do século XIX, privilegiou particularmente a pintura em detrimento das outras artes,

formou uma coleção que hoje ornamenta o Museu Nacional de Belas Artes e outras instituições,

lançou um fundamento teórico sólido e um método pedagógico adequado aos novos tempos e

ajudou a formar um mercado, e sua sucessora, a Escola Nacional, pôde absorver lições do próprio

modernismo para continuar a ter grande influência até os anos 1930 pelo menos. Seu círculo

expandido incluía inúmeros outros artistas nacionais e estrangeiros, colecionadores e interessados

em arte. A Academia Imperial também foi o principal alvo das críticas ao antigo sistema quando o

modernismo passou a prevalecer.[29][30][31]

O fato de Weingärtner não ter sido aluno da Academia Imperial é irrelevante para o entendimento

de sua produção e de sua inserção na vida artística brasileira, pois as academias que frequentou na

Europa funcionavam sobre as mesmas linhas e, na verdade, a instituição brasileira nasceu

exatamente à imitação do modelo importado. Weingärtner participou de inúmeros salões gerais

das duas academias e chegou a ministrar aulas de desenho na segunda, o que só confirma sua

perfeita adaptação ao sistema nacional e a identidade ideológica entre as escolas do Brasil e as

estrangeiras.[19][29][31]

As academias ministravam um ensino graduado, sistemático e profissionalizante, com forte ênfase

na perfeição técnica e na correta descrição da natureza e da figura humana, sendo necessários

vários anos de estudos preparatórios até a qualificação. Na disciplina acadêmica a proficiência no

desenho era fundamental, sendo o ponto de partida para a realização de toda obra, em qualquer

das várias técnicas das artes visuais.

 

[30][32][33] Embora não se conheçam detalhes sobre como se

deu o seu preparo nem de sua atuação como professor de desenho na Escola Nacional (Angelo

Guido mal toca no assunto, dizendo apenas que cumpria seus deveres e não gostava da função, e

Athos Damasceno só refere que era "competente e sensível"[2][34]), sobrevive o programa do curso

que ministrou, e que permite compreender a sistemática acadêmica da qual ele mesmo havia

recebido sua formação. Mantém-se a grafia da época:[35]

 

"Todo discípulo que entrar para a aula de dezenho é obrigado á fazer um trabalho de

prova, e conforme o trabalho que apresentar, entrará nas seguintes classes:

1o anno

1. desenho linear e figuras geometricas

2. desenho de folhas e ornamentos, copias de phototypias

3. as mesmas folhas e ornamentos formadas do natural e reproduzidas em gesso

4. modellos em gesso apresentando bocca, nariz, olhos, orelhas, etc.

 

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Cópia de estátua clássica,

Pinacoteca Barão de Santo

Ângelo

 

Estudo de modelo vivo,

1878. Pinacoteca Barão de

Santo Ângelo

 

2o anno

5. partes de extremidades mãos, pés, etc., formados em

gesso do natural

6. mascaras troncos, braços, pernas, formados do natural

7. bustos, cabeças, troncos de originaes antigos

3 anno

8. figuras antigas em tamanho natural (conforme o espaço

que houver na sala de dezenho)

9. retratos em tamanho natural, modello vivo"

 

Para a pintura também era essencial o perfeito domínio das técnicas

de perspectiva, da teoria das cores, das características dos pigmentos e

seu comportamento em combinação, das regras de composição, bem

como um conhecimento aprofundado de anatomia humana e animal,

além de ser importante o artista possuir uma sólida base em religião,

história - em especial da Antiguidade e seus mitos - e em história da

arte, conhecimentos que seriam de grande utilidade para uma

representação coerente e convincente dos temas respectivos, além de

demonstrar sua erudição. Todos esses tópicos eram estudados em

teoria e na prática.[32] Além disso, era parte inseparável dos cursos em

suas etapas avançadas a cópia de obras de mestres consagrados para

adquirir um bom senso de estilo e demonstrar competência

técnica.[30]

A necessidade de uma representação naturalista, porém, estava

vinculada a convenções idealistas inspiradas nos mestres consagrados

da tradição clássica, como maneira de assegurar a continuidade de

uma venerada linhagem cultural que havia se formalizado durante o

Renascimento mas que de fato remontava em última análise ao

sistema educativo da Grécia Antiga conhecido como paideia. Centrais

para o academismo eram as crenças que a arte pode ser transmitida

pelo ensino - daí o apreço pela tradição - e que o talento apenas não

conduz a lugar nenhum sem um treinamento disciplinado, racional e

metódico. Neste corpo de valores a liberdade criativa individual não

tinha um peso tão preponderante como veio assumir com o

modernismo. Valorizava-se acima de tudo a autoridade dos mestres e

buscava-se a produção de uma arte impessoal e funcional, que

expressasse valores de interesse coletivo e que tinha, entre outros, o

objetivo de educar o público e assim transformar a sociedade para

melhor, adotando princípios que possuíam, além de um caráter

estético, também um fundo ético e um propósito pedagógico. Mesmo

que tenham recebido inumeráveis críticas ao longo de sua história, as

academias foram inegavelmente o mais importante fator de estruturação de todo o sistema

artístico do ocidente moderno, recebiam o patrocínio dos Estados e serviam como instâncias

consagradoras e preservadoras de ideais não apenas artísticos, mas também políticos, culturais e

sociais alimentados pelas classes dominantes. Não admira que os acadêmicos fossem

repetidamente considerados conservadores e convencionalistas, quando não déspotas elitistas e

retrógrados, pelas sucessivas vanguardas que floresceram muitas vezes à margem das instituições

oficiais.[30][33][36][37][38][39][40]

Quando Weingärtner foi estudar na Europa este modelo formalista e idealista estava entrando em

crise, mesmo que nesta época ele estivesse alcançando o auge de sua abrangência, tendo se

disseminado por toda a Europa e Américas e passado a influenciar até mesmo culturas não-

 

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Oferenda ao Deus Pã, 1894. Coleção particular

 

Procissão interrompida, 1898

 

ocidentais. A esta altura, com a rápida ascensão da classe média como mercado consumidor de

arte, se tornaram cada vez mais frequentes liberdades em relação à rígida ortodoxia, tanto em

termos de tema como de forma e técnica, a fim de atender aos gostos ecléticos e pouco eruditos de

um público novo que já não via muito sentido nas solenes alegorias classicistas e nas obras

históricas e religiosas tão prestigiadas nos períodos anteriores, proliferando as cenas de costumes,

cenas domésticas, obras folclóricas, paisagens pitorescas ou exóticas, retratos, naturezas-mortas e

todos os outros gêneros antes considerados menores. Ao mesmo tempo, a liberdade criativa

individual se tornara uma bandeira inegociável para as novas gerações de artistas. Desta maneira,

começava a tomar forma o que mais tarde foi conhecido como modernismo.

 

[40][41][42][43] Embora

no Brasil a classe média demorasse muito mais para se tornar um mercado consistente, a

tendência era na mesma direção, como provam as críticas de Gonzaga Duque, Angelo Agostini e

outros intelectuais brasileiros, ligados ao modernismo emergente, a um sistema que já

consideravam obsoleto e em vias de extinção.[40][44][45]

Foi neste contexto renovado, multiforme e dinâmico que a heterogênea obra acadêmica de

Weingärtner se construiu e se destacou no cenário brasileiro, preservando muitos aspectos do

academismo tradicional, principalmente em termos técnicos e estilísticos, mas sensibilizando-se

temática e poeticamente com a nova ordem de valores.[46][47] O fato de ele ter sido pensionista do

governo durante o império e amigo pessoal de Dom Pedro II, abriu-lhe as portas do mercado do

Rio, a capital nacional, e tendo estabelecido laços de amizade com figuras eminentes da nova

república, como Joaquim Nabuco e o presidente Campos Sales, o apoio que recebeu contribuiu

significativamente para a consolidação do seu prestígio. Esta situação só viria a mudar no fim de

sua vida, quando o modernismo começou a ganhar amplo espaço.[8]

 

Sabe-se que Weingärtner prezava as tradições e era

por temperamento indiferente ao

experimentalismo, e a escolha de Roma como seu

centro de atividade europeia se explica pelo fato de

que a Itália em grande medida se tornara

artisticamente conservadora, perdendo sua

liderança para a França, que agora conduzia os

avanços na arte internacional.[2][8] Em meados do

século XIX os italianos enfrentavam uma séria crise

política, econômica e social, a população

empobrecia, o desemprego aumentava, a produção

agrícola estava desestruturada e em algumas

regiões a fome afligia as classes baixas,

desencadeando um grande êxodo populacional, e

além disso se desenvolvia, em meio a sucessivas

guerras, um árduo processo de unificação, quando

até então a península era um mosaico de reinos

independentes.[48][49] Diante deste quadro difícil,

para muitos artistas um retorno às glórias do

passado clássico em busca de soluções para o

dramas do presente se tornou o único caminho possível. Esse grupo atendia primariamente às

expectativas de uma elite alheia aos conflitos, que privilegiava obras idealistas e bucólicas que não

suscitassem maiores questionamentos. Weingärtner, aderindo voluntariamente ao programa

acadêmico tradicional, onde a herança da Antiguidade tinha um peso considerável, encontrou

nesses temas um ambiente propício para a expressão de algumas de suas próprias

aspirações.[8][13][50] Como analisou poeticamente Angelo Guido, essas pinturas satisfaziam seu

amor a uma beleza calma, amável, ordenada e à sua visão risonha da vida:

O cenário italiano

 

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Pompeianas no frigidário, 1897. Pinacoteca

APLUB

 

"E que mais sugestivo ambiente que o

de Roma, com suas ruínas veneráveis

evocadoras de séculos de arte, seus

palácios e jardins antigos, como os do

Pincio e da Villa Borghese, as fontes

habitadas por ninfas e nereidas, as

históricas colinas, os pinheirais

românticos e famosos, os arredores

extra-muros que lhe falavam de

rebanhos e pastores dos versos de

Virgílio, onde cada passo 'vigilantes e

meditativas almas de pedra' parecem

nos querer comunicar o segredo de uma beleza que se extinguiu, de histórias perdidas

no tempo e de vidas inúmeras que silenciaram..." [50]

 

É de assinalar também sua associação com o grupo de artistas In Arte Libertas, que além de se

dedicar a temas clássicos, se interessava pela paisagem italiana e seus aspectos folclóricos. Obras

como Ceifa em Anticoli, Procissão interrompida, O retrato da noiva e muitas mais são

representativas de sua atenção para com a vida da população rural e seus cenários

pitorescos.[8][13][50] Guido considera que esta mesma adesão ao classicismo iniciada em Paris deve

ter sido um dos motivos que o levou a se transferir da França para a Itália, cuja herança do antigo

Império Romano era em toda parte visível. Os próprios franceses ainda viam a Itália como uma

perene fonte de inspiração, tanto que o maior prêmio da academia parisiense era uma bolsa de

estudos para aperfeiçoamento em Roma.[51]

No Brasil o tema da Antiguidade também ganhava simpatizantes, pois as escavações e descobertas

arqueológicas que naquela época estavam sendo feitas em Pompeia e Herculano atiçavam a

curiosidade de muitos. Vários artistas brasileiros abordaram o tema, destacando-se Rodolfo

Bernardelli, Henrique Bernardelli e Zeferino da Costa. Outro que se dedicou a isso foi o celebrado

Lawrence Alma-Tadema, que Weingärtner possivelmente conheceu na Itália, pois algumas de suas

obras têm grande afinidade. Além disso, a preservação dessas cidades com suas habitações,

mercados e oficinas, permitiu ao público penetrar mais no cotidiano do romano comum, enquanto

que o que mais se conhecia até então eram os grandes monumentos públicos que falavam mais

sobre a vida política, religiosa e artística do império. O próprio Weingärtner visitou as cidades e

pintou várias telas diretamente inspiradas no cenário local.[13]

 

Nas palavras de Camila Dazzi:

"Weingärtner, portanto, está imerso em uma tendência igualmente nacional: a paixão

por Pompeia, a possibilidade de repovoar através da arte as suas ruas de vida,

encontrava, também no Brasil, os seus adeptos. E não nos referimos somente aos

artistas, pois se as obras eram realizadas em grande parte na Itália, era o público

brasileiro que elas visavam, sendo enviadas para figurarem em exposições públicas

onde podiam ser admiradas e adquiridas por particulares".[13]

 

Weingärtner floresceu em um período de importantes mudanças no Rio Grande do Sul. Iniciava-se

um processo de modernização na sociedade e na economia, e surgia uma classe burguesa abastada

que passava a cultivar as artes com um interesse crescente.[52] Tendo passado por asperezas e

limitações durante a Revolução Farroupilha (1835-1845), Porto Alegre, a capital, experimentava

rápida recuperação. Em 1858 foi inaugurada uma luxuosa casa de ópera, o Theatro São Pedro, os

saraus literários viravam moda, em 1868 foi fundada a Sociedade Parthenon Litterario, reunindo

os primeiros intelectuais e educadores de real mérito do estado, como Luciana de Abreu, Caldre e

Fião, Múcio Teixeira, Apolinário Porto Alegre e Carlos von Koseritz, e em 1875 foi aberto o

primeiro salão de artes.[2][53][54]

O contexto riograndense

 

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Fundo de quintal em Bento Gonçalves, na região

de colonização italiana, 1913. Coleção particular

 

Peões laçando gado, temática gauchesca, 1908.

Coleção particular

 

Remorsos, 1917, gravura em metal, reprodução

de pintura de 1893 sobre a Revolução

Federalista. Coleção particular

 

Acompanhando a tendência da segunda metade do

século XIX, em que o academismo brasileiro

entrava em sua fase de apogeu, a burguesia local

encontrava nesta escola seu ideal artístico, mas na

década de 1870, quando Weingärtner foi estudar na

Europa, Porto Alegre possuía apenas cerca de

quarenta mil habitantes, em muitos aspectos ainda

era uma cidade provinciana, e o mercado de arte

recém começava a se formar. Na pintura, salvo a

atuação pioneira do gaúcho Antônio Cândido de

Menezes, que recebeu formação na Academia

Imperial de Belas Artes, e uns poucos artistas

visitantes com bom preparo, como o já citado

Delfim da Câmara, Bernardo Grasseli e Francisco

Viriato de Freitas, que também deram aulas, o

cenário na pintura era caracterizado pelo

diletantismo.[52][55][56]

O impulso de progresso se acelerou na virada para o

século XX com um grande programa de obras

públicas e reurbanização da capital, estimulado pela

difusão da filosofia positivista, adotada pelo

governo, tanto que em 1908, com o apoio oficial,

pôde enfim ser fundada a primeira academia, o

Instituto Livre de Belas Artes, embora seus inícios

tenham sido muito modestos, oferecendo apenas

cursos de música e desenho, e o curso de pintura só

viesse a ser ministrado em bases regulares a partir

de 1936.[57]

Mas a elite consumidora de arte, e muito mais o

público em geral, em termos artísticos

permaneciam bastante conservadores, ignorando as

novidades que apareciam no centro do país e

continuando a preferir as obras acadêmicas, e por

isso durante a maior parte de sua carreira o pintor

encontrou resposta tão favorável junto aos seus

conterrâneos. Por outro lado, o mercado de arte da

cidade no início do século XX ainda era

pequeníssimo (vide nota:[58]) e não podia absorver

a sua grande produção, como lamentou Olinto de

Oliveira, um de seus maiores defensores, acusando a população, também, de ter uma mentalidade

excessivamente provinciana para reconhecer a sua verdadeira grandeza. A despeito da crítica,

Weingärtner se encontrava em uma posição bastante privilegiada na atenção dos portoalegrenses,

e mesmo que não vendesse muito ali a não ser retratos e estivesse ausente por longos períodos,

marcava presença enviando obras diversificadas com regularidade para exposição. A própria

abordagem que fez dos temas regionalistas se inseriu com perfeição em um programa ideológico

do governo que buscava consolidar a figura do gaúcho e do imigrante como símbolos identitários

do estado, sendo o primeiro a trabalhar com tais temas.[8][32][59][60]

No entanto, segundo Círio Simon, na república sua antiga ligação com o regime imperial às vezes

lhe trouxe problemas, e é significativo que não fosse chamado a integrar o quadro docente do

Instituto Livre depois que se fixou em definitivo em Porto Alegre. O pintor, porém, não se filiava a

ideologias políticas, tanto que não se esquivou de retratar o carismático presidente positivista do

 

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Tecelãs, 1909. Coleção particular

 

Garças, 1913. Pinacoteca Barão de Santo Ângelo

estado, Júlio de Castilhos, e pintar cenas da Revolução Federalista. É também ilustrativo das

contradições do seu contexto que o mesmo Instituto adquiriu uma obra sua para a Pinacoteca que

iniciava a se formar ao elevado custo de dois contos de réis, pagos pelo governo, e que o diretor da

Escola de Artes do Instituto, Libindo Ferrás, o tenha convidado para participar das bancas finais

de avaliação de alunos.[25]

 

Trabalhador incansável e perfeitamente

disciplinado, Pedro Weingärtner deixou uma obra

pictórica vasta, cosmopolita e eclética, em que

abordou temas mitológicos e classicistas,

folclóricos, retratos, paisagens, paisagens urbanas,

cenas de gênero, fantasias românticas e exóticas,

mas são mais importantes, como foi reconhecido

ainda em sua vida, as cenas de gênero e as obras

regionalistas sobre o sul do Brasil, onde deixou um

notável documento humano e social de seu

tempo.[2][15][61] Permaneceu fiel às suas origens

mas foi adaptável o bastante para sintonizar com o

espírito do seu tempo e dos lugares por onde

passou. Apesar de pintar principalmente para as

elites que dispunham de recursos para comprar

arte, sua obra não é limitada pelos ideais desta

classe, pois inúmeras vezes retratou o povo de

maneira sensível, simpática e honesta, sendo

significativo que desse a esses sujeitos mais

humildes um tratamento dignificante. A acusação

que os modernistas lhe fizeram, às vezes repetida

em tempos recentes, de ser um acadêmico

conservador e convencional, é uma visão

tendenciosa e datada da história, elaborada por

aqueles que triunfaram na disputa pelo mercado e

pelo controle da crítica. Agora, transcendendo as controvérsias internas do mundo da arte, se volta

a reconhecer sua posição eminente num contexto histórico e social mais amplo. Weingärtner

respondeu às demandas de um público expressivo em termos de número e em termos de poder

econômico e político, tornando-se um dos seus favoritos ao longo de quase toda a sua carreira.

Raríssimos eram os artistas que como ele vendiam todas as obras de suas exposições e receberam

tantas críticas positivas sem despertar controvérsia importante. Seu desbravamento da temática do

gaúcho também fala de um espírito que, se bem que satisfeito com o estilo que escolhera e avesso a

experimentalismos formais, pôde se abrir para novos horizontes, deixando na temática do

regionalismo uma contribuição qualificada e inovadora para a pintura

brasileira.[2][8][13][60][62][63][64] Um tanto surpreendentemente, considerando a popularidade que

os gêneros da pintura religiosa, das cenas orientalizantes e as naturezas-mortas desfrutavam em

sua época, não deixou nada nestes campos.[65]

Obra

 

Pintura

 

Aspectos gerais

 

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Tempora mutantur, 1889. Museu de Arte do Rio

Grande do Sul

 

Carreteiros gaúchos chimarreando, 1911.

Pinacoteca Aldo Locatelli

Possuía uma técnica refinada, com um desenho seguro, uma paleta rica mas contida e

harmonizada, um equilibrado senso de composição, um sensível manejo da luz e uma notável

capacidade de observação e descrição da natureza, sempre dando meticulosa atenção ao detalhe,

chegando a se aproximar dos efeitos da fotografia,[32][66][67][68] o que tornava seu estilo

inconfundível para seus contemporâneos.[69] Efetivamente ele usou fotos para criar muitas das

suas composições e detalhar os diversos objetos que pintou, uma prática que se tornava cada vez

mais comum. Sua associação com a técnica vinha desde quando ainda era um estudante, e quando

passou por tempos de pobreza pensou em dedicar-se profissionalmente à fotografia. Era também

amigo íntimo de fotógrafos, como o Lunara, com quem saía frequentemente em

passeios.[32][66][70][71]

Sempre demonstrou uma preferência pelas obras de pequenas dimensões, e mesmo nas grandes

seu amor ao detalhe parece revelar uma vocação de miniaturista.[2][15][68][72][73] Mas além de uma

inclinação natural, circunstâncias de mercado influíram em suas escolhas, pois obras grandes eram

vendidas com muito maior dificuldade.[22] Outro aspecto interessante em seu método é a

reutilização dos mesmos elementos em várias obras diferentes. Isso se torna flagrante na paisagem

que aparece em Tempora mutantur. A mesma paisagem já foi identificada em seis outras obras,

cinco pinturas - Cena de guerra (1894), A derrubada (1894), Paisagem derrubada (1898),

Carreteiros gaúchos chimarreando (1911), A morte do lenhador (1924) - e na gravura Paisagem

de Tempora mutantur, sem data. Tempora e Gaúchos chimarreando estão ilustradas abaixo para

evidenciar a semelhança.[74]

 

Suas opiniões sobre arte permanecem em grande

parte um mistério e quase só podem ser intuídas a

partir de seus trabalhos, pois perdeu-se praticamente

toda a sua correspondência, que possivelmente

constituía um rico repositório de informações,

queimada pela viúva para evitar a devassa de sua

privacidade.[2][75] Entretanto, sobreviveram alguns

 

outros documentos esparsos e várias cartas e cartões-

postais que permaneceram com amigos,[2] onde se

 

encontra um interessante relato sobre a obra

Tempora mutantur, que retrata um casal de

imigrantes repousando após um dia de trabalho duro

no campo:

"Este quadro fiz expressamente para nós, porque

aqui na Europa não se compreende facilmente o

assunto; inspirei-me, para fazê-lo, em certo tipo que

encontrei em nosso caro Brasil, homens que aqui na

Europa faziam figura, de famílias nobres, que por

qualquer motivo abandonaram a pátria atrás da

fortuna na América e caíram no caminho e lá se

foram água abaixo e ficaram reduzidos ao que vi....

Eu quis fazer um tipo.... que, não encontrando

ocupação, foi obrigado a retirar-se para uma colônia,

e esta é a cena que reproduzi no quadro, o primeiro

dia de trabalho, a pobre mulher vendo as mãos que

foram belas e alvas, hoje queimadas pelo sol e

calejadas pelo primeiro labor".[8]

 

Cenas regionalistas

 

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Nova Veneza, na região de colonização italiana,

1893. Coleção particular

 

Kerb, 1892. Coleção particular

 

Como já se aludiu, com as obras regionalistas sobre

os gaúchos e imigrantes foi um pioneiro, a bem dizer

abrindo toda uma nova seara para a pintura

brasileira, e possivelmente esta seja sua contribuição

mais meritória, podendo ser comparada à do muito

mais célebre Almeida Júnior com seus caboclos e

caipiras paulistas.[2][59][64][76] Essas cenas que

mostram o povo sulino, que iniciou a criar ainda na

década de 1890, se tornam importantes também

como um testemunho de uma modernidade avant la

lettre, prefigurando o chamado que Mário de

Andrade, um dos principais agentes do modernismo

brasileiro, faria nas décadas de 1920-1930, para que

os artistas retratassem a rica diversidade social e

cultural do país e abandonassem de vez o discurso

visual homogeneizador, centralizador e europeizante,

que vigorava desde meados do século XIX.[77]

Quando abordou a vida dos colonos italianos e

alemães não hesitou em explicitar as dificuldades por

que passava essa população, que lutava para

estabelecer uma vida digna depois de muitas

privações em seus países de origem e que chegara ao

Brasil só para encontrar privações semelhantes numa

terra ainda selvagem, e que no caso dos italianos foi em grande parte abandonada pelo governo,

que os aliciara com promessas enganosas sobre uma terra da cocanha que só existia na

propaganda oficial.[78][79] Mas também parece ter em certo sentido se afinado a esse discurso,

encarando a colonização como um projeto heroico e civilizador e trazendo em seus quadros

exemplos de colonos que haviam conseguido conquistar um bom padrão de vida. Em muitas telas

mostrou ainda momentos alegres, de confraternização coletiva, como em Kerb, uma festa típica

dos alemães, ou cenas singelas em que a dureza da vida parece harmonizada no contato com a

natureza ou na vivência das coisas simples do cotidiano, como exemplifica Fundo de quintal em

Bento Gonçalves, com uma menina a dar de comer a perus e patos, ou Fios emaranhados,

retratando o interior de um empório em que uma senhora se ocupa com bordados enquanto uma

criança deitada no chão se diverte com os objetos de um caixeiro-viajante que ela espalhou pelo

chão.[80]

Mas mesmo quando seu trabalho se dirige claramente para o realismo, ao contrário dos pintores

da vanguarda francesa, que mostravam com crueza as duras condições de vida de uma população

sofrida e embrutecida, Weingärtner frequentemente tingiu a descrição da realidade com tons

poéticos e idílicos e uma grande dose de compaixão, como atesta sua própria declaração sobre o

Tempora mutantur, recém citada.[8][13] Isso não impediu que em alguns momentos a crônica da

vida popular assumisse um tom humorístico, como se percebe em Chegou tarde!, onde um

caixeiro-viajante entra em um empório no interior carregando sua mala de artigos só para

encontrar um concorrente já entretido em negociações com sua cliente.[8]

Suas cenas gauchescas mostrando as lides do campo, com seus peões e tropeiros em seus cavalos

conduzindo as boiadas, seus churrascos, as charqueadas, pousadas e pastagens, são especialmente

importantes porque se encaixaram num projeto político do governo do seu estado, uma vez que os

positivistas governantes, junto com um influente grupo de descendentes de alemães que havia

conquistado proeminência econômica e se havia integrado perfeitamente à realidade riograndense,

fomentaram o cultivo da temática do gaúcho, bem como em menor grau do imigrante, como

símbolos de valor e identidade regional, onde as obras do pintor nestes gêneros encontraram

naturalmente um lugar destacado.[8][32][80] Mas é de assinalar que tais cenas vendiam mais no

 

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A derrubada, 1913. Museu Nacional de Belas

Artes

 

centro do país do que em seu próprio estado, pois lá eram vistas como atraentes exotismos.[81]

Esta

iconografia consagrada por Weingärtner se cristalizou no imaginário popular e entre as

instituições que integram o chamado Movimento Tradicionalista Gaúcho, que promovem o cultivo

de um universo gauchesco estereotipado e hoje são uma força poderosa na cultura estadual.[82][83]

 

Foi também um grande paisagista, variando sua

abordagem entre uma descrição estritamente

realista, com "um agudo senso de exatidão", como

referiu José Augusto Avancini, e um tratamento

relativamente livre, construindo o cenário em suas

linhas mais essenciais em gestos largos e manchas

difusas, mas mesmo nestes casos a descrição da

geografia permanece reconhecível o bastante para

permitir sem dificuldade a identificação do local

exato que originou as obras. Muitas vezes se

preocupou em captar o pitoresco do cenário,

incluindo na imagem alguma edificação

característica, alguns personagens à distância com

trajes típicos da região.[84][85] Em alguns casos

documentou as agressões que o meio ambiente

brasileiro vinha sofrendo, como o desmatamento, as

queimadas e a erosão do solo.[77] Porém, no conjunto da sua produção a paisagem em geral é um

pano de fundo subordinado a cenas que representou em primeiro plano, fundindo as categorias de

paisagem e cena de gênero.[32][80]

 

Segundo Ana Albani de Carvalho,

 

"Encontramos em Weingärtner uma atenção especial e, nestes termos, um

protagonismo, na representação da paisagem como 'materialização de um instante da

sociedade' (SANTOS, 1997:72), onde o gaúcho, o imigrante, o trabalhador rural

aparecem como sujeitos de diferentes relações sociais.... O mundo do trabalho rural

também é foco de atenção em obras realizadas a partir do cenário europeu, como em

Ceifa, situada em Anticoli, Itália.... A possibilidade de representar a paisagem, a

arquitetura e os tipos regionais é percebida por Weingärtner não apenas como uma

renovação em sua obra, mas como uma efetiva contribuição ao campo da arte, já que

tal temática não era usual, nem divulgada em outros centros, mesmo nacionais".[32]

 

Suas cenas de gênero são a parte mais complexa de sua produção, tanto por sua diversidade

temática como por seu tratamento variado, e em inúmeros casos a categoria se confunde com

outras e perde seus limites nítidos.[60] As que representam a elite urbana em seu próprio "habitat",

refletem tipicamente o espírito da belle époque, quando a sociedade brasileira passava, entre

grandes crises e contradições, de um modelo monárquico, senhorial, rural e escravagista para

outro republicano, burguês, urbano e capitalista. Se no Rio Grande do Sul esta elite ainda estava

em formação e tinha menos luzes, no centro do país, de longe o seu maior mercado no Brasil, ela já

estava mais consolidada e era mais poderosa economicamente, mas para ambas a aquisição de

obras de arte se tornava cada vez mais um sinal de educação e status, contrastando fortemente com

o período imperial, em que a elite quase não investia em arte. Damas e cavalheiros da melhor

sociedade desfilam em seus quadros com todos os emblemas de sua classe: suas roupas finas e

jóias, vivendo em residências suntuosas e levando uma existência despreocupada, até entediada,

em uma opulência e abundância decorativa que beiram o kitsch, em que se criava uma nova

sensibilidade e palpitavam novos anseios.[8][40][59][86][87][88]

Paisagens

 

Cenas de gênero

 

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O importuno, 1919. Coleção particular

 

O notário, 1892. Coleção particular

 

Feira de cerâmica em Anticoli, 1908. Coleção

particular

 

Ruth Tarasantchi notou que essas obras muitas

vezes são ambíguas, a exemplo de O importuno, em

que uma fina jovem, sozinha em uma sala

ricamente ornamentada, dá a impressão de

aborrecer-se com a chegada de um cavalheiro, mas

"o leque que segura nas mãos enluvadas, que lhe

encobre o rosto e esconde seu olhar matreiro, talvez

implique, ao contrário, tratar-se de um encontro

nada fortuito, mas que assim quer parecer". Em

outros momentos, porém, ele estabelece uma visão

claramente crítica e revela as sombras e desenganos

de uma classe que se esforça por manter as

aparências brilhantes, como em Casamento de

conveniência, em que a esposa, ainda jovem,

vestida de gala e pronta para sair para o baile, onde

esperava divertir-se, olha com enfado para seu

marido, um velho, já adormecido numa poltrona,

tendo seu desejo frustrado. Em No penhor uma

dama visivelmente acabrunhada vende suas jóias

numa casa de penhores que não passa de uma

espelunca, uma imagem de decadência de grande

força expressiva.[89]

Mas também a classe média passava a se dar certos

luxos e desejar obras de arte em que pudesse

reconhecer a si mesma e mesmo imaginar-se mais

"chique", já que tais obras em geral tinham

pequenas dimensões e se tornavam

acessíveis.[40][87] É um bom exemplo O notário, um

pequeno-burguês que aparece em seu escritório

compenetrado em seu trabalho mas vestido com

apuro e rodeado de objetos sugestivamente

culturais: uma estatueta de bronze e um bandolim.

Mas nem sempre essas imagens serviam a

pretensões de prestígio, e a temática centrada neste

grupo social é variadíssima: interiores, cenas de

trabalho e lazer, pessoas de todas as idades,

encontros românticos, cenas irônicas ou

humorísticas, e muitas mais, numa vasta crônica do

universo das pessoas comuns e anônimas.[90]

Finalmente, entram nesta categoria as cenas da vida

camponesa europeia, em que deixou grande

quantidade de obras que começou a trabalhar na

Itália, principalmente na região de Anticoli

Corrado, mas que também observou depois em

Portugal. Da mesma forma, são muito variadas em

tema e tratamento, passando de imagens

fortemente realistas a representações de grande

poesia, e desde cenas do trabalho no campo a

retratos da vida nas pequenas vilas com seus costumes ancestrais e seu folclore, suas feiras, festas e

ofícios urbanos. Fazem em geral um apelo ao pitoresco e ao singelo do mundo real, mas às vezes

são em certo sentido idealizantes e nostálgicas, se aproximando do imaginário historicista e

classicista.[60]

 

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Cena de guerra, 1893.

Coleção particular

A grande aceitação que a pintura de gênero conheceu no Brasil desde o fim do século XIX também

se deve a outros fatores, entre eles a popularização da fotografia e a concomitante ascensão da

estética realista na pintura, havendo uma correspondência entre ambas por responderem à

demanda por uma representação verossímil da realidade. Ao mesmo tempo, formavam-se novos

conceitos de intimidade, de desfrute do lar, de relações sociais e familiares, onde se tornava

importante a decoração esmerada dos interiores a fim de tornar a residência um local aprazível

para estar e para a socialização da família e com os amigos. Neste sentido, a pintura de cenas

domésticas, para quem as consumia, era um espelho de reconhecimento e afirmação desta

intimidade privilegiada e "moderna",[40][87]

 

como comentou Marize Malta:

 

"A existência de quadros na parede significava ter o que olhar, poder desfrutar do

prazer que a profusão de cores e detalhes proporcionava ao privilegiado observador:

um prazer pessoal. Ele via uma 'bela' representação da cena familiar imaginada,

idealizada, ilusória – um trompe l'oeil da imaginação. Devido à sua visibilidade, a tela,

compartilhada por outros olhos (estranhos ao domicílio), servia também para

demonstrar gosto, conhecimento, prestígio e confirmar a distinção daquele que

possuía tão destacado quadro.... Os quadros de gênero deram um lugar prestigioso

para a vida dos objetos decorativos aos olhos do fruidor. Mundo imaginado (o

pictórico) e mundo real (do objeto concreto) se interpenetravam. Essas pinturas não

eram meras descrições de interiores de uma história do presente, eram construções

visuais que estavam modelando maneiras de encarar modos de morar e de olhar para

a parede das casas.... Na tela ou na domesticidade, uma iconografia do decorativo se

estabelecia, fruto de novas visualidades que falavam de uma arte acessível, uma arte

com a minúsculo, uma arte ao alcance das mãos".[87]

 

Estas obras são, pois, também um importante documento de uma

época de grandes mudanças. Paralelamente, a ebulição cultural e

artística nos altos estratos refletia na população de forma positiva,

pois as exposições de arte de modo geral, mas principalmente as

grandes exposições gerais das academias carioca e paulistana, onde

as pinturas de gênero se tornavam cada vez mais comuns, atraíam

um público proporcionalmente maior do que conseguem hoje até

mesmo as megaexposições trazidas do estrangeiro e divulgadas com

todas as fanfarras da mídia contemporânea. Era um tempo em que a

arte mais sofisticada se tornara verdadeiramente popular.[8][59][86]

 

Weingärtner deixou pouquíssimas obras no gênero histórico, um

punhado de pinturas e menos gravuras sobre a Revolução

Federalista (1893-1895), e elas merecem uma nota especial tanto por

sua raridade como pelo dramatismo que em algumas imprimiu, e

pelas suas grandes qualidades estéticas. Seu envolvimento com a

Revolução foi casual: estava viajando pelo interior de Santa Catarina

para fazer apontamentos quando foi abordado por uma tropa de revolucionários e foi obrigado a

acompanhá-los por uma semana. Foi bem tratado mas testemunhou cenas sangrentas, e acabou

adoecendo. A tela mais impactante é Cena de guerra, em que um pai de família jaz morto ao chão

enquanto sua mulher, aos gritos, amarrada a uma estaca e semidespida, vê sua casa em chamas e a

desolação em seu redor. Uma criança se abraça às suas pernas, apavorada, e um velho com as

roupas esfarrapadas tenta se erguer do chão. Também muito dramática é A derrubada, uma

variação resumida da outra que talvez tenha sido um estudo preparatório, centrando-se na imagem

da mulher, que mostra o semblante transtornado contra uma paisagem sombria.[91]

 

Obras históricas

 

Classicismo

 

11/11/2022 12:52 Pedro Weingärtner – Wikipédia, a enciclopédia livre

 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Weingärtner 19/31

 

Idílio, 1908. Coleção particular

 

Retrato de Angélica

Weingärtner (mãe do pintor),

1894. Pinacoteca APLUB

Suas obras classicistas e mitológicas, por seu turno,

mesmo com a progressiva mudança nos gostos em

direção a temáticas contemporâneas, eram ainda

muito apreciadas. Não se conhece em detalhe sua

formação, mas já na Alemanha deve ter tido seu

primeiro encontro com os clássicos, tanto pelas

obras que deve ter visto em museus, como pelas

aulas acadêmicas, onde a cópia de obras clássicas

era parte da disciplina. Um segundo impacto o teve

certamente em Paris, onde temas clássicos tinham

grande espaço na pintura, e seu professor francês

Bouguereau era famoso por suas composições sobre

a Antiguidade e seus nus idealizados. Indo para a

Itália, mergulhou em um ambiente saturado de

Antiguidade. Naturalmente, deixou uma grande

quantidade de peças neste gênero, como Dáfnis e

Cloé (1891), Oferenda ao deus Pã (1894) e Idílio

(1908). Havia um ótimo mercado, uma parte da

burguesia gostava de encontrar nessas pinturas

espelhos onde pudesse reconhecer suas próprias

alegadas virtudes e ideais. Mas além de

alimentarem esse mercado, Weingärtner

verdadeiramente apreciou o tema, tratando-o com

poesia. Certas obras remetem à mítica Idade

Dourada, trazem atmosferas contemplativas e bucólicas, transpirando uma harmonia ideal entre

homem e natureza, e de certa forma representavam também uma espécie de fuga romântica dos

problemas modernos.[8][13][50] Como disse Angelo Guido, "para ele o motivo clássico era o

tranquilo abandonar-se à evocação serena de uma beleza desaparecida, beleza de tempos distantes,

em que se lhe afigurava que a criatura humana vivia com mais naturalidade e, por isso, mais

próxima às fontes da felicidade e da poesia".[50]

 

Outras, porém, como a série das Pompeianas, são imagens prosaicas

e historicistas que se assemelham em espírito, se não em

ambientação, à temática das cenas de gênero burguesas e

urbanas.[13] Noutras ainda, como em Ninfas surpreendidas e

Caçadora de borboletas, que realçam o corpo feminino nu, ele pôde

destilar toques discretos de erotismo.

 

[81] Em muitas obras de gênero,

como já se mencionou, em que retratou pastores e camponeses de

sua própria época, também se nota a influência classicista em suas

atmosferas e cenários bucólicos e numa representação idealizante

dos tipos humanos.[60][70][92]

 

Seus retratos são pouco conhecidos e estudados. As poucas

apreciações que há discordam em aspectos fundamentais, embora

sempre encontrem grandes virtudes nos melhores exemplares, como

os de sua mãe, de sua esposa, de seu irmão Inácio e de Bruno Chaves.

Angelo Guido considerava que ele demonstrou uma notável capacidade de concentração formal e

economia de meios, prescindindo de detalhes e da descrição da vida interior dos sujeitos para criar

obras de qualidades puramente pictóricas. Já Neiva Bohns qualificou alguns como admiráveis por

razões opostas, encontrando neles obras de sensível registro emocional e minuciosa representação

de detalhes.[8][93]

 

Retratos

 

11/11/2022 12:52 Pedro Weingärtner – Wikipédia, a enciclopédia livre

 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Weingärtner 20/31

 

Apontamentos de animais, grafite

 

Nu recostado, carvão e pastel, 1883. Coleção

particular

 

Cena antiga, 1916, gravura em metal. Museu de

Arte do Rio Grande do Sul

 

Alguns retratos, os da elite, se aproximam das cenas de gênero, mostrando personagens em

ambientes sofisticados indicativos de sua alta posição, e entretidos em lazeres de índole cultural.

Um bom exemplo é o Retrato da Senhora Bruno Toledo, instalada em uma sala repleta de

ornamentos caros e tocando uma grande harpa dourada. Várias outras peças também podem ser

entendidas como retratos embora não se possa saber a identidade do modelo, como Gueixa, Moça

no jardim, Indecisa e Preparada para o baile.

[60][94]

 

Sua obra em desenho - com vários materiais:

grafite, nanquim, aquarela, pastel - é de toda a sua

produção a parte menos conhecida e a menos

acessível. Os cerca de 60 desenhos e alguns blocos

de notas que hoje se conhecem dele constituem

provavelmente apenas uma ínfima fração do que ele

produziu, mas são importantes porque dão uma

ideia do seu método de trabalho e atestam o seu

domínio do traço. O desaparecimento desses

trabalhos se deve a que não se destinavam à

exposição ou ao comércio, mas em geral eram

simples estudos de anatomia ou esboços

preparatórios para obras em pintura, mas alguns

são, no entender de Alfredo Nicolaiewsky, perfeitas

obras de arte. Como para todos os acadêmicos, o

desenho era fundamental no seu processo criativo, e

realizou inúmeros estudos e apontamentos para

suas composições definitivas, pois pouco lugar para

o improviso existia dentro do rigoroso método

acadêmico.[75]

 

Angelo Guido assim o descreve:

"Pelo que se pode deduzir de vários

cadernos que examinamos, não viajava

nunca, não realizava mesmo um

passeio.... sem levar o seu pequeno

caderno em que ia anotando o que lhe

interessava ou podia servir-lhe para

uma composição. E os desenhos

miúdos, cuidados ou rápidos, mas

sempre reveladores de perícia

surpreendente e da elegância

conquistada pelo seu traço, iam

enchendo páginas e páginas,

constituindo um dos aspectos da sua

obra sumamente interessante, não só

pelo que nos revela do seu valor como

desenhista, como observador agudo e

estudioso apaixonado do conteúdo

estético das coisas, mas também pelo

que documenta relativamente aos seus

processos de trabalho, ao cuidado e

honestidade com que era a sua obra de arte elaborada".[95]

 

Desenho

 

Gravura

 

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Caricatura de

Weingärtner feita por

Henrique Bernardelli,

1894. Suas asas têm

a forma de paleta de

pintor

 

Paulo Gomes considera sua obra gravada não menos importante do que sua obra pictórica, mesmo

que neste campo sua produção tenha sido reduzida, principalmente porque ele foi um dos

precursores da gravura em metal no Brasil.[96] Além disso, suas peças são de elevada qualidade

estética e demonstram seu perfeito domínio das técnicas da água-forte, a mais comum, onde

predomina o grafismo, e da água-tinta, menos frequente, que possibilita a obtenção de efeitos

pictóricos. Quase todas são monocromáticas, mas uma delas é uma monotipia a cores. Em sua

maioria possuem pequenas dimensões. Não se sabe com quem aprendeu a gravar, e como no Brasil

ainda não havia equipamento adequado, foram realizadas na Itália. Seu estudo é dificultado pela

ausência, em algumas delas, de marcações de tiragem, data, assinatura e outras informações

técnicas que hoje são padronizadas, e é possível que tenham sido feitas tiragens póstumas ou

clandestinas, pois no conjunto a qualidade da impressão é desigual. Segundo análise de Anico

Herskovits, aparentemente as impressões originais são, em geral, aquelas em tinta sépia, e as

impressas em preto são posteriores. Algumas são reproduções de pinturas de sua autoria, um

hábito comum em seu tempo e que objetivava facilitar a divulgação e o comércio de suas imagens.

Assim como suas pinturas, se caracterizam pela grande meticulosidade no tratamento dos

detalhes. Seus temas são variados, incluindo paisagens, retratos, cenas gauchescas e cenas

mitológicas.[96][97][98][99]

 

Sobre estas, disse Neiva Bohns:

 

"Nestas gravuras, os personagens aparecem sempre em estado contemplativo, ou de

perfeita integração com o ambiente natural. Inteiramente livres das convenções

sociais, e adaptados a uma natureza embriagante, mostram-se à vontade, e seus

corpos, freqüentemente desnudados, não parecem agredir princípios morais da

sociedade européia novecentista, embora possam ter sido perturbadores para a

parcela da conservadora sociedade gaúcha que as conheceu, ainda sem repertório

suficiente no que se refere aos assuntos da cultura clássica".[8]

 

Durante quase toda a sua trajetória madura, como já foi dito, sua obra

encontrou um público muito receptivo, e foi louvado repetidas vezes como

um pintor ilustre. Na sua primeira individual no Rio, em 1888, foi saudado

como "o primeiro pintor brasileiro", pois "nenhum compatriota nosso

chegou, com o pincel, a tanta perfeição no desenho, tanta fineza no

acabado e tanta observação no estudo".[8][61] Uma crônica de janeiro de

1894 na Gazeta de Notícias carioca afirmava que sua obra "agrada a todo

gênero de pessoas e satisfaz tanto ao crítico quanto ao artista e ao

diletante".[68]

 

Em outubro, o mesmo jornal voltou a prestigiá-lo:

"A nós faz-nos conta dizer que o Pedro é brasileiro, pois que

deixou o umbigo no Rio Grande do Sul, e gaba-se de ser

guasca. Henrique Bernardelli desenhou-o com asas; é que as

tem, o diabo do Pedro, e tem voado por esses ares fora,

fazendo-se um artista com quem se deve contar. Na exposição

atual, Weingärtner está bem representado, e os amadores

(colecionadores) parecem dispostos a deixar-lhe o atelier

vazio. Pouco importa; ele não tem medo de trabalhar, e em

breve o veremos, de volta dos seus pampas, oude Berna, ou

da Alemanha com um novo sortimento de trabalhos, em que

sempre há a notar um passo adiante. É que o Pedro não é um oficial de pintura; é um

pintor em toda a extensão da palavra".[72]

 

No panorama da pintura do seu estado, mesmo ausente por longos períodos, ele foi a figura

dominante até pouco antes de morrer, com o auge de sua influência na década de 1910, mesmo

quando já apareciam em cena outros nomes de valor, como Oscar Boeira, Libindo Ferrás e

Fortuna crítica

 

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Retrato do artista

 

Leopoldo Gotuzzo.

 

[59] Uma notícia no Correio do Povo em 1900 dá uma

 

boa ideia do apreço que lhe devotavam em sua terra:

 

"Encontra-se de novo entre nós o insigne pintor rio-grandense

Pedro Weingärtner que volta da Itália, a repousar do trabalho

junto da família, na terra que se orgulha de tê-lo como filho. O

nosso patrício, que descende de uma família de modestos

artistas, tem sabido honrar no Velho Mundo o nome brasileiro

e dar lustre a seu estado natal. Ao mérito indiscutível de artista

exímio, considerado por muitos como o primeiro pintor

brasileiro, Weingärtner junta a glória de se haver feito por si,

iniciando sua carreira desajudado da fortuna, sem proteção

estranha e não confiando mais que no próprio esforço,

alentado por uma grande força de vontade".[8]

 

Raras vezes recebeu críticas em vida, das quais merecem nota artigos publicados pelo modernista

Gonzaga Duque, nos quais, se por um lado elogiou sua meticulosidade e técnica requintada, por

outro enxergou em suas composições um caráter dispersivo e meramente cumulativo. Num dos

textos disse:

 

"Vendo os quadros do Sr. Pedro Weingärtner lembro-me do trabalho daquele obscuro

construtor naval. Todos esses alfarrábios, panos, escrínios, leques, rosários, carteiras

de colecionador, todas essas recordações de viagens, de tempos, de história, de artes,

de arqueologia, e essas cabeleiras empoadas, esses rostos, esses corpos do Espólio

(título de uma pintura) custaram ao artista um trabalho fatigante, um ano de existência

dispendido em alguns meses de paciência, de observação e de cuidados. E tudo isso

reunido, dificilmente dá uma impressão intensa. [...] Não quero dizer com isso que os

quadros do Sr. Pedro Weingärtner sejam defeituosos. As suas telas têm incontestável

valor, tomadas como reunião de acessórios escrupulosamente concluídos".[61]

Também é de lembrar a polêmica em que se envolveu em 1909 a respeito de uma tela

encomendada pelo governo riograndense, que deveria mostrar uma cena gauchesca e ser instalada

no salão nobre de um navio da marinha brasileira a ser batizado com o nome do estado. Intitulada

Rodeio, ao ser exibida foi massacrada pela imprensa e pelo público, que consideraram sua

descrição dos tipos regionais pouco fiel, com erros na representação da indumentária e dos

apetrechos de trabalho rural. Como resultado, a encomenda foi cancelada. Esta grita, cuja

virulência foi única em um currículo recheado de sucessos, não obstante serviu, como disse Neiva

Bohns, para abrir uma discussão frutífera no estado.[8] Não importando se a crítica foi ou não

justa,

 

"O fato inaugura o primeiro debate público sobre arte (ou melhor, sobre formas de

representação pictórica) que se tem notícias no sul do país, com intensa participação

de setores populares, que detinham maior ou menor conhecimento sobre as lides

campeiras – e muito pouco sobre pintura – e identificavam as falhas de representação.

É claro que se pode também entender esta rejeição coletiva à obra de Pedro

Weingärtner como um prenúncio de seu declínio artístico e social, já que um artista tão

fortemente ligado ao projeto imperial não tinha condições de ser incorporado com

facilidade à era republicana".[8]

 

Na década de 1920, com efeito, o ambiente artístico nacional e estadual já estava sendo

impregnado pela proposta modernista, surgindo uma nova geração de pintores que passou a

representar séria concorrência para os acadêmicos convictos como ele.[32][52] Em 1923 Ercole

Cremona no Rio ainda dizia que os muitos adjetivos que lhe dirigiam não tinham nada de

gratuitos,[15] mas foi sintomático do novo estado de coisas que sua derradeira exposição em Porto

Alegre, em 1925, apesar de recebida com entusiasmo na imprensa, teve um público inexpressivo,

foi encerrada antes do prazo previsto e foi um fracasso de vendas. Pelos motivos expostos, logo

 

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Ateliê em Roma (1910)

 

Atelier de Pedro Weingärtner em

Roma, 1890. Coleção particular

 

depois de sua morte sua obra caiu na obscuridade.[32][52]

Também contribuiu para a perda de sua memória ele não ter

fundado uma escola estética na província, nem ter aceitado

alunos,[25] e ter sido um descendente de alemães num período

em que o Brasil se engajava em um projeto nacionalista e

xenófobo.

[63]

 

Depois de vários artigos escritos por Olinto de Oliveira ainda

em sua vida,[2] somente em 1956 ele foi objeto de um estudo

sistemático, realizado pelo influente crítico e professor local

Angelo Guido, que resultou em um livro, Pedro Weingärtner,

que até hoje permanece como a referência básica sobre ele.

Athos Damasceno apresentou um ensaio em 1971, em grande

parte baseado em Guido, incluído no seu livro Artes Plásticas

no Rio Grande do Sul.

 

[2][61][74] Sua reputação na década de

1980 entre importantes críticos do centro do país não era

muito lisonjeira: Quirino Campofiorito o considerou

excessivamente apegado ao detalhe, produzindo obras "em que

a minúcia parece responder por toda a razão do quadro", mas

também elogiou sua paleta limpa e sua pincelada ágil,

afirmando que "não poucos de seus quadros, embora afetados

por essa sobrecarga de minúcias, revelam o pintor sensível e

tecnicamente seguro, porém rigorosamente disciplinado para o

registro estritamente visual. É, essencialmente, um pintor

naturalista".[100] José Roberto Teixeira Leite em suma repetiu

o que já dissera Gonzaga Duque:

"Pedro Weingartner nada tem de um precursor de novas

tendências, que não sentiu, ou sentiu de muito longe. [...] Foi

sem dúvida, como lhe chamou Gonzaga Duque, um 'paciente

e meticuloso mouchiste (miniaturista) das figurinhas liliputianas

e das paisagens microscópicas'; mas teve também emoção, tolhida embora por uma

sensibilidade que, fugindo deliberadamente ao mundo e ao tempo em que vivia, achou

refúgio no ambiente ideal de uma perdida Beleza".[101]

 

Novos estudos tiveram de esperar até o fim do século XX para aparecerem, sendo empreendidos

principalmente por um grupo de pesquisadores gaúchos, entre eles Paulo Gomes, Alfredo

Nicolaiewsky, Círio Simon, Maria Lúcia Kern, Ana Albani de Carvalho, Susana Gastal e Neiva

Bohns, fazendo leituras sobre aspectos de sua obra e trazendo à luz novas

informações.[8][32][61][63][66][67][74][102] Talvez não seja de surpreender que eles se devam aos

próprios gaúchos, considerando que a maioria dos pesquisadores da arte acadêmica brasileira

atuam no centro do país e historicamente se concentraram quase só no que se produzia no eixo Rio

de Janeiro-São Paulo, deixando as outras regiões à sombra e aplicando o termo "regionalismos"

como um rótulo pejorativo, mas como lembrou Amélia Siegel Corrêa, em tese defendida na

Universidade de São Paulo, "estudos recentes têm mostrado cada vez mais a relevância artística e

social dessas produções, como é o caso de Weingärtner, cuja obra tem sido rediscutida e

reavaliada".[77][102]

Para os críticos riograndenses, no entanto, ele é outra vez uma unanimidade, voltando a ocupar a

posição de o mais insigne pintor da escola acadêmica nativo do estado, visto como um personagem

decisivo para o amadurecimento da arte local, até então praticada em geral de forma amadora, mas

mesmo que sua biografia seja conhecida em linhas gerais, os detalhes estão quase sempre ausentes

ou são imprecisos e contraditórios, e estão à espera de estudos mais abrangentes e esclarecedores.

Mas essa pesquisa é dificultada por hábitos do próprio pintor, como já alertava Guido em 1956:

"Das fotografias guardadas dos seus quadros Weingärtner nunca anotou o título, nunca tomou

 

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Convite de exposição gravado pelo

 

próprio Weingärtner, com um auto-

retrato, 1919. Coleção particular

 

Modelos no atelier. À extrema

direita, o pintor

 

nota das pessoas, museu ou associação a que vendeu

numerosas das suas obras, cujo destino ignoramos. O trabalho

para elaborar uma lista, embora incompleta, das obras

pintadas por Weingärtner foi enorme". O inventário que fez

listou 196 pinturas e 15 gravuras, mas Athos Damasceno deu

uma outra lista. Paulo Gomes analisou ambas e concluiu que "a

tentativa de comparar as duas listas [...] resulta num imbróglio

inacreditável devido à discordância de dados, principalmente

dos títulos, além da ausência de medidas e descrição dos temas,

impedindo assim uma lista definitiva". Sua correspondência,

como já foi dito, perdeu-se na maior parte.[61] Angelo Guido

teve a sorte de poder consultar muitos documentos originais

que estavam em posse do médico do pintor, mas depois

igualmente foram perdidos.[103] Do seu pensamento artístico,

sua visão de mundo, não restaram quase registros, e sua vida

privada ainda é uma completa incógnita. Ainda são necessárias

muitas pesquisas para que sua trajetória e contribuição sejam

corretamente entendidas e apreciadas. Como assinalou Paulo

Gomes, "acreditamos que a certeza da importância da sua obra

criou uma aura impenetrável de consagração e também de

silêncio".[61] Suas pinturas fazem parte do acervo de coleções

privadas e muitos museus importantes, já são outra vez bem

valorizadas no mercado local e mesmo nos maiores centros do

país — sua tela O Discurso e a Admiração em 2012 entrou num

leilão em São Paulo ao lance inicial de 225 mil reais[104]

—, mas

sua obra em gravura e desenho está em grande parte dispersa e

raramente é lembrada.[61]

Mesmo entre todas as dificuldades, os esforços para sua

recuperação têm conseguido importantes conquistas. Diversos

ensaios vêm sendo-lhe dedicados, muitos deles publicados na

revista eletrônica 19&20, focada no mundo artístico brasileiro

entre o século XIX e início do século XX;[74][105] sua obra

gráfica já foi trazida à luz parcialmente em duas exposições,

ambas em Porto Alegre: A obra gravada de Pedro

Weingärtner, e Pedro Weingärtner: obra gráfica,

 

[74] e em

 

2009-2010 foi organizada sua maior retrospectiva, intitulada Pedro Weingärtner: Um Artista

entre o Velho e o Novo Mundo, com cerca de 150 obras em várias técnicas de acervos públicos e

privados, e que foi exibida na Pinacoteca do Estado de São Paulo, no Museu Nacional de Belas

Artes e no Museu de Arte do Rio Grande do Sul, com grande repercussão nacional.[76][106][107] De

fato, mais do que ser apenas uma bela mostra, ela representou um grande impulso nas pesquisas

sobre o artista, ainda tão desconhecido, mobilizando um pequeno batalhão de historiadores,

críticos de arte, instituições, galerias e colecionadores em esforço conjunto.[108] Maria Hirszman,

crítica de arte do jornal O Estado de São Paulo, disse que a retrospectiva era a correção de uma

injustiça histórica,[107] e foi considerada uma das mais importantes exposições do ano pelo crítico

Tadeu Chiarelli, em matéria para a Folha de São Paulo.

 

[62] Ruth Tarasantchi, que idealizou e fez a

curadoria geral da retrospectiva, disse que os três grandes museus envolvidos deram total apoio ao

projeto, reconhecendo Weingärtner como um grande mestre merecedor de maior atenção. A

curadora também reconheceu o valor da biografia pioneira de Angelo Guido, dizendo que a

pesquisa recente tem confirmado as informações que ele transmitiu.[102] Todas as três exposições

produziram catálogos com textos críticos. Alfredo Nicolaiewsky sintetizou o estado da arte sobre

ele: "Não sendo ainda o levantamento completo de sua obra, já é possível ter-se uma boa visão do

 

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https://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Weingärtner 25/31

conjunto. A partir deste material podemos começar a estudar questões internas à obra, aspectos

que somente agora se tornaram visíveis".[74] Paulo Gomes também está desenvolvendo uma

pesquisa para elaborar o primeiro inventário sistemático de sua obra pictórica e gravada.[109]

Por ser um processo recente de resgate, o grande público ainda o desconhece e ele ainda não

recebeu a devida atenção da crítica brasileira em mais larga escala.[13][25][61] Para muitos

estudiosos ele é um artista menor, como informou Círio Simon: "O século XXI, que se julga acima

 

do raio e do trovão, certamente pode ignorar a obra de Pedro Weingärtner ou, no máximo, espetar-

lhe, nas costas, um alfinete e incluí-lo na coleção dos 'pequenos mestres' ", apesar de ter em vida

 

sido considerado um dos mais importantes pintores do Brasil e ter sido o primeiro artista gaúcho a

fazer um nome no estrangeiro.[13][25][61] Para Neiva Bohns, "infelizmente, a história deste artista,

como de muitos outros que não aderiram aos procedimentos modernistas, ficou estigmatizada por

uma classificação em que tudo o que se refere ao academismo parece lembrar conformismo,

subserviência aos padrões estrangeiros e espírito conservador".[8]

 

Jardineira tirolesa,

1885. Coleção

particular

 

Fios emaranhados,

1892. Coleção

particular

 

Passarinheiros,

1893. Coleção

particular

 

Caçadora de

borboletas, 1904.

Pinacoteca APLUB

 

Casamento de

conveniência, 1909.

Coleção particular

 

Cena campestre,

sem data. Coleção

particular

 

O fidalgo (vista de

Bento Gonçalves,

na região de

colonização

italiana), 1913.

Coleção particular

 

Retrato de Elisabeth

Schmitt, 1918.

Museu Nacional de

Belas Artes

 

Salvo indicação de outra referência, os dados foram obtidos do Instituto Itaú Cultural.

 

[110][111] A

 

lista possivelmente é incompleta.

Lista de exposições

 

Individuais

 

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https://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Weingärtner 26/31

Em Porto Alegre: 1878 (Loja Rosa e Irmão), 1887,[112]

1893,[2]

1894 (Drogaria Inglesa),[2]

 

1894,[2]

1895 (várias pequenas exposições),[2]

 

1897 (Ao Preço Fixo),[2]

1898,[2]

1899

 

(Litografia Weingärtner),[2]

 

1900 (Ao Preço Fixo),[2]

 

1913 (Casa Luiz Voelcker), 1924 (Clube

 

Caixeral), 1925 (Galeria Jorge), 1925 (Casa Jamardo).

No Rio de Janeiro: 1888, 1889, 1911, 1922.

Em São Paulo: 1900, 1905, 1910 (Liceu de Artes e Ofícios), 1923.

Em Pelotas: 1920.[113]

 

Em Porto Alegre: 1881 (Exposição Brasileira-Alemã), 1901 (Exposição Comercial e Industrial -

medalha de ouro).

No Rio de Janeiro: 1884 (26a Exposição Geral de Belas Artes, Academia Imperial de Belas

Artes), 1890 (Exposição Geral de Belas Artes, Escola Nacional de Belas Artes - ENBA), 1894,

1895, 1896, 1898, 1902, 1905, 1906, 1908, 1909, 1922 (1a, 2a, 3a, 5a, 9a, 12a, 13a, 15a, 16a,

29a Exposição Geral de Belas Artes, ENBA).

Em São Paulo: 1911 (1a Exposição Brasileira de Belas Artes, Liceu de Artes e Ofícios), 1922

(1a Exposição Geral de Belas Artes, Palácio das Indústrias).

Em Paris: 1891 (Sociedade dos Artistas Franceses),[114]

 

1898 (Salão de Paris), 1900.

 

(Exposição Universal), 1900 (com Pedro Américo e Eliseu Visconti).

Em Chicago: 1893 (Exposição Universal).

Em Londres: 1897 (Salão de Londres - participação incerta).[2]

 

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=CREMONA%2C_Ercole._O_Sal%C3%A3o_do_Centen%C3%A1rio._Illustra%C3%A7%C3%

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Referências

 

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58. O ambiente artístico era limitado a ponto de suas exposições, na inexistência de galerias de

arte, precisarem acontecer em armazéns e bazares; uma vez chegou a expor numa farmácia.

Muitas de suas mostras na cidade, por isso, trouxeram poucos quadros, e mais de uma vez

expôs apenas uma tela, embora nestes casos sempre de grandes dimensões. Cf. Damasceno

pp. 196-216; 244-247

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m.br/estado/253251/margs-apresenta-primeira-grande-retrospectiva-de-pedro-weingartner.htm

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Cultural, 15/04/2005

 

11/11/2022 12:52 Pedro Weingärtner – Wikipédia, a enciclopédia livre

 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pedro_Weingärtner 31/31

Academia Julian

Victor Meirelles

Pedro Américo

 

«DezenoveVinte - Arte brasileira do século XIX e início do XX.» (http://www.dezenovevinte.net/

bios/bio_pw.htm)

 

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